Sunday, April 24, 2011

Mrs. Dalloway


She felt very young; at the same time unspeakably aged. She sliced like a knife through everything; at the same time was outside, looking on. She had a perpetual sense (…) of being out, out, far out at sea and alone; she always had the feeling that it was very, very dangerous to live even one day.

Mrs. Dalloway, Virginia Woolf







Lili

Sunday, April 10, 2011

Londrina


Uma cidade inteira deixa-se estar, meio despida, a sorver o sol. Uma cidade que prontamente se declararia uma (senão a) referência de civilidade e decoro, à luz de um qualquer conjunto de preceitos impressos na tábua rasa ocidental.

Aqui há códigos de indumentária e de conduta. Aqui há mulheres em topless no meio da cidade. Aqui há homens de fatos à medida, nas carruagens do metro, com semblantes carregados de responsabilidade económica e marchas cheia de propósito. Aqui há homens de fato à medida, nas carruagens do metro, em sexta-feira embriagada, a dedicar a plenos pulmões serenatas a moças de cabelos armados e olhos carregados, desajeitadamente, de negrura. Aqui há casamentos reais cheios de pompa e circunstância. Aqui há roupa interior e preservativos dedicados a esses casamentos. Aqui há janelas sem cortinas e portas abertas. Casas que parecem convidar mas que possuem uma rede invisível em seu redor. Aqui a vergonha fica com quem espreita. Fica comigo. Que passo vidas inteiras a olhar. Que observo os homens semi-nus, num domingo langoroso, no parque a jogar à bola. Que me foco nos reflexos dourados dos cabelo de um bebé de feições (surpreendentemente) asiáticas, para o qual sorrio. Que me regozijo no olhar desfocado de um jovem cão e que lhe jogo a mão para lhe incentivar o entusiasmo, para ver os meus esforços invalidados pelo dono, que puxa pela trela e me admoesta com o olhar.

Aqui os animais correm livremente. Os pelicanos, os gansos, os patos, os esquilos, seguem-te pelo parque. Aqui as ovelhas fogem às crianças e às suas mãozinhas esticadas, tão determinadas em afagá-las e puxar-lhes a lã fofa. Aqui não há cães nem gatos vadios. Aqui o sol é precioso. Aqui a chuva é ignorada. Aqui a relva é pisada. Aqui é proibido alimentar os pombos. Aqui o rio é sujo. Aqui o rio é lindo e cheio de vida. Aqui, em dias de Verão, as crianças mais atrevidas atiram-se ao seu leito e nadam entre o lixo e as galinholas. Aqui é proibido nadar no Tamisa.

Aqui a roupa nova é barata e a que se finge velha cara. A verdadeiramente datada ainda mais. Aqui ¼ quilo de batatas custa 1 libra. Aqui um chocolate custa 30 cêntimos. Aqui a comida chinesa é barata. Aqui a comida mediterrânea é uma iguaria. Aqui o pão não é bom. Aqui os bolos fascinam o paladar. Aqui há feijão ao pequeno-almoço, em mesas de madeira riscadas e gastas. Aqui há chá das cinco, em cadeiras de veludo e estampados de algodão.

Aqui sorriem-te. Aqui não te olham nos olhos. Aqui o telejornal não é narrado em jeito de novela de faca e alguidar. Aqui a imprensa é facciosa e falaciosa. Aqui a cultura é de graça. Aqui o entretenimento é dispendioso. Aqui miscigenam-se. Aqui segregam-se. Aqui o olhar empanturra-se de belos homens. Aqui o olhar de muitos deles empanturra-se com outros belos homens.

Aqui não me importo com as idiossincrasias. Aqui sinto saudades das idiossincrasias da minha terra natal. Aqui sinto-me a borbulhar e não a secar. Aqui afogo-me em escolha.

Aqui entrevejo-me. Aqui não me reflicto. Como num puzzle, com um céu que parece infindável, sou uma peça azul de três quinas, com encaixe que se antevê mas ainda invisível a olho nu. Sou azul da cor do mar mas encaixo-me no céu.

Falta-me adjacência. Falta-me aconchego. Aqui.

Lili

Sunday, March 27, 2011

Falso ídolo


Que feitiço é este, o do enamoramento?
Onde vejo falhas, vê perfeição. Onde vejo horrores, vê salvação. Onde vejo mediocridade, vê excelência. Onde antevejo repulsa, sente desejo.
E que pena quebrá-lo. Que tragédia perder esse olhar, de inevitável precariedade, sobre mim. Não mais vai existir essa centelha a arder por mim lá fora, no mundo frio. Não mais haverá alguém a sonhar com um alguém que não vejo mas que em mim vê. Um olhar terno sobre mim. Sou tentada a alimentá-lo, a atiçar a constância desse fogo e banhar-me no calor projectado por essa imagem durante um pouco mais. Só mais um pouco.
Um toque. Um olhar. Um sorriso. E o banal sente-se como calculado. Natural e antecipado, miscigenados. As palavras saem-me vazias mas cheias de intento. E mexer-me sabendo que quem me olha contempla uma divindade e não mais um ser humano. E andar sabendo que olhos parciais me seguem e me apreciam e nos meus gestos vêem graça. Mel escorre dos meus dedos e a visão da minha língua atiça outra e formiga a pele. O meu riso ecoa e reverbera no oco de outra mente. Sou reverenciada. Idolatrada. Não quero mas sou querida. Não olho mas sou olhada. Não sinto mas sou sentida.
Que feitiço é este, cujo reflexo me enfeitiça também a mim? Encaro-me e, no mais fugaz dos instantes, vislumbro-a, a deusa. E também o meu olhar se cobre de brandura. Enfeitiço-me. Pondero amá-la. Pondero sê-la.

Lili

Wednesday, February 16, 2011

The Romantics

Tom: Has it ever occurred to you that I might need a woman like Lila?
Laura: And what kind of woman is that?
Tom: I don’t know. Somebody happy!
Laura: Meaning numb?
Tom: Somebody practical.
Laura: Meaning busy!
Tom: Somebody confident.
Laura: Meaning rich!
Tom: Somebody stable.
Laura: Meaning frigid!
Tom: Somebody who doesn’t have to tear other people down just to build herself back up!
Laura: So in other words, your polar opposite!
Tom: Yeah, yeah, maybe…
Laura: Well haven’t you heard opposites attract and then… then they fucking bore each other to death!
Tom: You know, boring is better than maddening.
Laura: I’d rather die of excitement.



Lili

Tuesday, January 4, 2011

Senão possibilidade

Lembras-te quando combinámos olhar todas as noites para o céu, naquela mesma hora? Aí, mesmo na distância, haveria sempre a hipótese de numa dessas noites sincronizarmos os nossos olhares na mesma estrela. Talvez a mais brilhante, talvez a maior, talvez a mais tímida. Pouco interessava senão a possibilidade. E quando isso acontecesse, e apesar de nenhum de nós o poder saber, nem em alma nem em corpo, o universo sabê-lo-ia. A estrela sabê-lo-ia. E não seria a beleza ou o brilho dela o alvo do nosso olhar naquele momento, mas sim o reflexo dos olhos de ambos. Ela seria não mais que um espelho do nosso amor. Peneirenta, seria usada.

Somos parte do Universo, amor.
Sabemos.

Lili